sexta-feira, abril 04, 2008

Umas e outras...do meu dia-a dia

Há coisas que ilustram os dias...
E dá vontade de contar.

Na quarta-feira, depois que falei com a secretária lá da clínica da Galp, no Alecrim, e ela me disse que era muito cedo e teria muito que esperar, que dava tempo de ir tomar o pequeno-almoço, concordei. Já tinha tomado, mas resolvi caminhar um pouco pela volta. Não conheço muito lá prá aqueles lados e, é assim afinal que acabo por conhecer Lisboa.


Fui andando até o Cais do Sodré, Rua do Alecrim abaixo. Depois virei à direita. Cedo ainda, todo mundo correndo pro trabalho. E eu ali...a esbanjar as horas.
Dei de cara com o Mercado da Ribeira e me deu aquela vontade irresistível de entrar.
A atividade fervilhante me encanta. E os odores, então, nem me falem. Noutro dia li nalgum lugar que os cheiros das frutas e dos legumes no Mercado da Ribeira são algo que os hipermercados nunca sonharam ter.
E eu concordo.
Misturam-se ali os vendedores, que chegam muito cedo, antes mesmo do nascer do sol, os fregueses, que podem ser donos de restaurantes tradicionais, dos mais populares, ou das pequenas tascas e ainda as donas ou donos de casa. O ambiente é colorido, cheira a campo, a mar, a verde.
Alguma coisa da memória dos olhos e do olfato.
Ando às voltas, com muito vagar, absorvendo cada detalhe, cada aroma, cada rosto, cada gesto.
Sinto-me bem ali.

A vida salta mesmo aos olhos.
As flores são um capítulo a parte. Lindíssimas. Só não me cai muito bem a quantidade de coroas funerárias prontas, fazendo a linha de frente nas bancas das flores. Mas o povo, quando precisa, é lá que vai buscar, por isso, tá explicado. Uma questão prática.

Já no último corredor dou com uma cena especial.
Uma senhora, de uma das peixarias, salta sobre um velhinho que caminha vagarosamente entre as bancas, alheio a tudo, como se não fosse com ele. Ela grita muito, a ponto de saltarem-lhe as veias todas do pescoço. Grita e diz-lhe nomes. Todos os possíveis e imagináveis. Tento perceber o que se passa. Imagino que ele tenha mexido em algum dos seus peixes, tentado furtar, não sei. Em segundos o povo se junta em volta e ela faz-me parecer que gosta da platéia, porque aumenta ainda mais o volume e persegue o velhinho, que continua alheio, sem nem olhar prá ela ou prá quem quer que seja, como uma criança marota que fez arte e agora se faz de salame.
De repente, a um canto, pousa um pão com um recheio qualquer. Ela pega o pão do chão, meio mordido, abre, mostra ao povo, ao velho. Grita coisas que não entendo. E atira o pão ao velho, que continua alheio, caminhando. Junta o pão de novo. Agora já atira
no velho.
O velho na frente, nem é com ele, ela atrás, dentro de umas botas de borracha de cano alto, pretas, e muitas roupas, umas por cima das outras. E o povo atrás dos dois, curioso. Uns a rir-se, outros indignados. Ainda não dá prá ver se contra ou a favor do velho. E também não consegui saber ao certo do que ele era acusado. Tenho prá mim que a fúria dela era pelo "nem te ligo" do velho.
O que se passou a seguir, não sei, mas o movimento continuou, enquanto eu me afastava. Estava na minha hora de voltar ao consultório.
Fiquei com aquilo na cabeça.
À tardinha ainda comentei com a dona Graciete.
Quando comecei a contar, no meio do assunto, ela já se adiantou:
- Era uma peixeira!
Eu disse: - Sim, bem parecia.. Mas como sabe?
-Ah...porque aqui toda a gente sabe, quando aparece alguém assim, muito espalhafatosa, com as mãozinhas na cintura, feito açucareiro, gritando dentro de um mercado, é peixeira, na certa.
Eu tive que rir.
A cena valeu.
Ainda volto lá noutro dia. Desta vez com a câmera na mochila, ah...pois é.

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