quinta-feira, abril 28, 2011

S O R T E L H A

Visitei Sortelha pela primeira vez em 2003.
Tempos encantados em que um castelo fazia diferença.
Apaixonei-me por Sortelha assim que a vi.
Mas era pelo castelo e pelo que havia lá dentro. Do resto nunca soube. Ou pelo menos nunca me detive.
A população preferiu progressivamente instalar-se em zona mais fértil e menos acidentada, formando a vila na parte de baixo. O Castelo é o ponto mais alto da vila e hoje são poucas as pessoas que lá vivem. A maior parte delas são idosas. As casas foram sendo compradas por pessoas que as usam como casas de temporada. Alguns as tem para aluguel, para pernoites dentro do castelo. Foi uma forma de manter tudo conservado.
Na primeira vez em que fui, conheci uma senhora que fazia cestinhos de vime, minha mãe tem até hoje um que levei de lembrança. Fiquei ali conversando e perguntando coisas da vida das pessoas do lugar. Ela sorria com seus enormes olhos azuis, tão azuis como o céu de Sortelha e continuava a fazer cestos, como quem tem um tique imparável. Devia ser descendente de celtas, com aqueles olhos.
Dali mesmo, de um orelhão, liguei à minha mãe:
_ Ô mãe, isso aqui é tudo muito bonito. E frio. Mas não há neve - era novembro, neve mesmo só um bocadinho lá em cima, na torre da Serra da Estrela. Prá eu poder tocar e sentir que era gelada, mas não molhava. Nevinha de amostra.
A minha mãe, na primeira vez que vim, tinha muito medo que eu caísse nas mãos de alguma quadrilha, dessas que sequestram as pessoas para tirarem-lhe os órgãos e vender. Mãe tem essas coisas.
_ Ô mãe, ainda tô aqui com todos os meus órgãos!
_Que guria bem louca! Deixa de dizer bobagem. E estás gostando da viagem? Me conta, é como nos livros?

Sortelha caiu-me no goto, desde a primeira vez, é verdade.
A casa onde dormimos era a Casa da Lagariça, que ficava fora dos muros do castelo, descendo a rua, na noite que cheirava a fumo das lareiras acesas e a assados. Fazia um frio de rengueá cusco, como se diz lá no meu sul. E comemos carne de javali ou outra caça qualquer, no Restaurante D. Sancho. Lareira acesa, paredes de pedra, candeeiros rústicos e os únicos clientes éramos nós, atendidos pela proprietária. Uma simpatia.

Voltei a Sortelha no feriado de Páscoa, com o grupo de autocaravanistas.
Continua lindíssima.
A vista desde o castelo é inesquecível.
A dona Felismina continua lá, fazendo os seus cestinhos. Um pouco mais velhinha, agora com 87 anos. Reconheci-a pelo azul dos olhos. Iguaizinhos.


Fui tomada por uma espécie de alegria infantil ao vê-la, sentadinha não na mesma pedra onde a encontrei pela primeira vez, mas ainda num banco feito na pedra, sempre a mexer as mãos mágicas de transformar vime em cestinhos. Uns com tampa, outros sem, vai tirando o vime de um feixe e os apetrechos de dentro de uma sacola de couro, pousada aos seus pés. E com uma agulha grossa, vai prendendo o vime, com um fio mais fino. Conversamos. Ela pôs-me a par das coisas acontecidas nesses oito anos. Como duas amigas que não se viam há anos. Continua a vestir-se de preto, da cabeça aos pés, viúva eterna do seu marido querido que foi-se há tempos e de quem ela jamais esquece. E continua a viver sozinha e Deus em uma das casinhas dentro dos muros do castelo. Os vidros das janelas muito limpinhos e as cortininhas rendadas todas muito branquinhas. Casinha de boneca. E a simplicidade a sair-lhe pelos olhos azuis. Poucas vezes saiu dali e foi só a passeio.
Uma história bonita.











A outra história é a da Sylvie e do Marco. Ambos franceses, filhos de portugueses emigrados para a França. Ele, nascido nos Alpes franceses; ela, nos arredores de Paris. Vinham passar as férias na terra, como se diz aqui. Ver a família. Ela sonhava em viver em Sortelha. Encontraram-se numa dessas férias e apaixonaram-se. Casaram e vieram viver ali. Faz agora oito anos (ou serão doze? Não, doze são os anos que ele vive em Portugal, ela veio depois) São donos do bar mais simpático do castelo, o Bar Campanário. Ela também trabalha como guia ali dentro. São felizes e dá prá ver no brilho dos olhos e no sorriso sincero.
Prometi a ela que falava bem de Sortelha aqui no blog. Mas nem era preciso pedir.
Sou encantada com aquele lugar e falo isso a toda a gente.
Vale a pena conhecer Sortelha, é uma das aldeias medievais mais bonitas e interessantes de Portugal.




Ah...sim, a Casa da Lagariça continua lá. Muito bem cuidada.



O Restaurante D. Sancho também está no mesmo lugar e continua tendo um ar extremamente aconchegante. Entramos prá tomar um café no andar de baixo, não resisti a curiosidade de ver de novo aquilo por dentro. As cabeças de alce ainda estão nas paredes e os olhos deles não param de nos olhar.
A lareira, os móveis, o cheiro, tudo igual.
Um lugar de se estar na maior, a saborear a melhor comida da região, regada a um vinho especialíssimo, à beira do fogo, no inverno.
Irresistível Sortelha, isso é o que é!

terça-feira, abril 26, 2011

B E L M O N T E

O Concelho de Belmonte abrange um território onde o patrimônio é considerável, estando integrado no Programa das Aldeias Históricas em Portugal.
Mas o mais importante e onde reside a minha curiosidade, é que por estas paragens viveram grandes homens e nasceram personagens da história portuguesa, determinantes para a história do Brasil, como é o caso de Pedro Álvares Cabral, o nosso descobridor. Belmonte é, desta forma, a terra de Cabral, dos seus ancestrais e descendentes. O primeiro alcaide de Belmonte foi Luís Álvares Cabral, bisavô de Pedro. E o Castelo de Belmonte foi entregue, a título hereditário, juntamente com o senhorio da vila e seu termo, a Fernão Cabral I, neto do primeiro alcaide e pai de Pedro Álvares Cabral. O Castelo, então, passou a ser a primeira residência dos Cabrais, onde terá nascido o descobridor do Brasil.







Atualmente o castelo tem funções turísticas e culturais, tendo sido construído para o efeito um anfiteatro ao ar livre e algumas salas museológicas para o espólio arquelógico do concelho e de temáticas relacionadas com Pedro Álvares Cabral e os Descobrimentos.



















À saída do castelo, do lado direito, onde está o Largo do Brasil, encontra-se a Igreja de S. Tiago e o Panteão dos Cabrais. Aí podemos ver os túmulos de vários elementos da família, entre os quais o do pai e da mãe e parte dos restos mortais de Pedro Álvares Cabral, vindos de Santarém, que estão dentro de uma arca tumular de granito. Em Santarém ficou parte das cinzas, a outra parte está no Brasil. Diz-se que está um terço em cada um dos lugares.



Na parte superior, atrás, a arca tumular em que estão guardadas as cinzas de Pedro Álvares Cabral (parte delas)





Dentro dos muros do Castelo as casas são todas térreas e com pequenas janelas, encostadas às rochas e construídas em pedra; as ruas são calçadas com granito e há muitas flores nesta altura do ano. Em cada casa há uma placa com o nome da família que ali vive. No ar, um cheiro de lenha queimando e de pão recém feito. O resto a imaginação se encarrega de inventar.



Conhecendo Portugal




Os feriados foram bons prá gente se embrenhar serra adentro e conhecer algumas vilas e aldeias históricas da Beira Baixa, aqui em Portugal.
Saímos na quinta-feira à tarde, em direção a Belmonte. Uma viagem que poderia ter levado umas duas horas e meia, talvez três, mas com as confusões e acertos de uma tal senhora que fala desde o interior de um aparelhinho chamado GPS, com uma voz estridente, chata e repetitiva, acabamos por chegar ao destino por volta das oito da noite. A dormida foi junto ao estádio de futebol do Belmonte, no estacionamento ao lado. Por ali se arranjaram as vinte e duas autocaravanas (motorhomes) e seus ocupantes, entre adultos, crianças e o pessoal da feliz idade, num total de cinquenta e cinco pessoas.
Antes devo dizer que pertencemos ao CAI - Clube Autocaravanista Itinerante, aqui de Portugal, do qual é presidente atuante a Ana Pressler, carinhosamente chamada de Bruxinha, juntamente com o seu marido Rui, um moço super simpático que ama o surf e que entende tudo de autocaravanas. Pois, em comemoração ao primeiro ano de fundação do CAI, eles e mais alguns componentes do clube organizaram o passeio. Abastecida a geladeira (frigorífico), munidos de vinho, pães alentejanos, enchidos e queijos, lá fomos nós, com o primo Sérgio de companheiro.


25 DE ABRIL

E ontem foi feriado nacional.
Trinta e sete anos desde a Revolução dos Cravos, que libertou Portugal e os portugueses do jugo fascista, durante quarenta e oito anos, salvo erro. Uma ditadura que custou caro ao povo desta terra, em todos os sentidos.
Não pude observar grandes comemorações, como nos anos anteriores. Talvez pela situação em que se encontra o país. Com o FMI por aqui a ditar as regras, não há grandes ânimos.

P Á S C O A

E a Páscoa passou sem mais delongas.
Não enviei mensagens, recebi algumas de amigos muito queridos, a quem ainda não agradeci - só li depois de chegar em Lisboa, ontem - liguei e falei com os meus filhotes (à exceção da Raquel, que tem sempre o telefone desligado, mas prá quem mandei muitos beijos pela Carol e pelo Rodrigo).
E era isso.
Não sei se é altura de me perguntar se ando ficando meio insensível ou se passei a dar valor àquilo que realmente tem. Sinal dos tempos? Sinal de mim? Ou nada disso?
Não comprei nenhum chocolate, também não ganhei nenhum, não presenteei ninguém e não me importei de maneira alguma com isso.
A minha irmã Mara me falou um dia que eu estava ficando estranha, que tinha assimilado a cultura européia. Acho que não. Em todo o caso, comecei a prestar mais atenção ao que venho sentindo, que é prá ver se não me desvio da minha essência que, segundo ela e mais alguns, é de manteiga derretida.
A bem da verdade, tenho sentido imensa saudade do meu país, do meu estado e da minha gente, sob os mais diversos aspectos. E põe aspecto nisso! Mas acho que não está aí especificamente a Páscoa.
Outra verdade, mas que nem por isso me redime (se culpada for), é que andei viajando nestes dias e fiquei complemente sem acesso à internet, embora tenha levado o modem da Vodafone comigo. E o aparelho que temos para carregar baterias de telefone e outros trecos mais deve ser um aparelho da treta, não carregou nada. Assim foi que fiquei praticamente incomunicável, salvo raras exceções, no caso de ligar aos filhos. E quando consegui carregar, graças à amabilidade de uns companheiros de uma outra autocaravana, não havia rede prá ninguém.
Assim é que, embrenhada nas montanhas da Beira Baixa, estive off a maior parte do tempo. Mas cheia de saudade, isso também é verdade. O que continua nada tendo a ver com Páscoa, sinto saudade em tempo integral.

quinta-feira, abril 21, 2011

Rumo à Serra

Hoje à tarde tomaremos o rumo da Beira Baixa, nas faldas da Serra da Estrela.
Belmonte é a cidade de origem de Pedro Álvares Cabral, o descobridor do Brasil. Lá está a casa onde nasceu e viveu com a família. Já estive lá uma vez, mas desta vou tentar descobrir mais coisas e depois conto aqui.
Na segunda-feira estou de volta.
Entretanto, levo o netbook e vou tentar ir postando as fotos.
Uma Páscoa Feliz para todos.

Não. Nem sempre o menor caminho entre dois pontos é uma reta. Também pode ser uma curva. Depende. E há ainda os obstáculos...

quarta-feira, abril 20, 2011

Acordando numa quarta-feira...

Pulei cedo da cama, hoje.
Quando digo cedo, falo de antes das cinco da matina. É mesmo cedinho.
Nada de especial, apenas prá adiantar umas aulas de inglês, que posso fazer pela internet, antes do presencial. Hoje à tarde há encounter e ando meio sem tempo de me preparar. Assim, só caindo da cama mesmo. Mas o curso tá legal, a Wall Street tem um método interessante. Gosto disso. E acho que tô conseguindo recuperar o que andava esquecido.
Precisava.

Chove desde ontem em Lisboa. aliás, desde anteontem. Tempo enferruscado. Fica tudo sem cor.

Ontem à noite fomos até o hotel Nacional, no centro, ver uma amiga da minha irmã e colega do meu cunhado, de Rio Grande, que está de passagem em Lisboa, a caminho de Paris. A Susel fez a travessia prá Portugal em uma excelente viagem de navio, que durou quinze dias. Conheceu Lanzarote, Tenerife, Sevilha e mais algumas cidades da Espanha. Um dia ainda quero fazer uma viagem dessas. Deve ser super divertida. Uma simpatia, a Susel. Adorei conhecê-la.

terça-feira, abril 19, 2011

PERDIDOS & ACHADOS

É verdade. Encontrei o livro sobre a vida da Mercedes Sosa que havia perdido. Já andava me sentindo mais pobre.

Tempos melancólicos

Pois é... às vezes bate...fazer o que?

Tio Clóvis

Uma grande e querida figura da nossa infância, adolescência e pela vida afora. Descansou, ontem, depois de lutar anos a fio pela vida. E com que garra! Era o nosso Highlander. Vamos sentir imensa saudade, tio. Que encontres a paz merecida. Obrigada por tudo.

Tocando em frente...

E afinal, ontem , não houve praia prá ninguém. Prá aproveitar a folga, faxina na autocaravana, almoço e toca vir prá Lisboa. Via-se o mar, é verdade. E nunca esteve tão azul. Mas o vento esteve judiando. E a água do mar aqui, mesmo no maior dos verões, de temperaturas bem altas, é gelada. Brasuca não entra. Acostumados que estamos com a água morninha do Brasil...nem por decreto. Mas valeu. Encontramos amigos, almoçamos no Tic Tac um peixinho bacana, deu prá carregar baterias, que a coisa por aqui anda pegando. O país tá aos pulos. E nem me atrevo a falar sobre. Hoje, arrumando a bolsa (bolsa de mulher é aquele caos instalado), percebi que faltava a minha carteira. Quase endoidei à procura da dita. Toda a minha vida ali (hehe). Cartões, RG, CPF, cartão de crédito, carteira de motorista, visto de residência em Portugal e por aí vai...Menos mal que depois de muito campear, acabei por encontrar junto ao painel da autocaravana, lá no estacionamento, que fica a uma hora daqui. Prá isso não fui trabalhar, não fui à aula, fiquei como barata tonta à procura. Dia não. Só de pensar que não vou precisar fazer tudo de novo, me deu vontade de comemorar. Se não tivesse encontrado, ia ficar mesmo atrapalhada.

sábado, abril 16, 2011

ERICEIRA - onde o mar é mais azul.

Estamos a cerca de trinta e cinco quilômetros do centro de Lisboa, a noroeste. A vila é antiga. Presume-se que tenha sido local de passagem e instalação dos fenícios. Por muito tempo teve como atividade principal a pesca. Mas as ondas deste mar tão azul ficaram famosas e atraíram surfistas do mundo todo e muitos turistas. E a vila cresceu, criou personalidade. Gosto demais daqui. O ar cheira a mar, há um clima praiano, que lembra recantos de Floripa, no Brasil. Gente bronzeada circula vestindo roupas coloridas, as pranchas fazem parte do cenário e a comida é uma delícia. Há muitas marisqueiras, restaurantes típicos, onde se come todo o tipo de mariscos e um saboroso arroz de tamboril *. As ruas são limpíssimas, as casas muito bem cuidadas, vemos flores por todos os lados, há notória preocupação com a educação ambiental. O atendimento é ótimo, as pessoas são simpáticas e agradáveis. Há por aqui um excelente astral.
Com o calor que já começa a fazer, vemos muita gente na praia.


Na praça principal, em frente ao Turismo, encontramos esta dupla do Equador, a fazer um som bonito e contagiante: o Patrício e o Milton. As pessoas param, sentam nos banquinhos e ficam a assistir. Algumas como nós, mais emocionadas, compram algum cd. Gosto do ritmo. Há qualquer coisa em mim que fica muito tocada quando escuto a música que eles fazem. E gosto das roupas, das cores, dos instrumentos que utilizam para fazer os seus sons, da dança. Como se fizesse parte de mim. É algo que não sei explicar. Talvez seja a descendência indígena, um tanto remota, mas presente com certeza. Minha tataravó era índia. A avó do meu avô materno.

Tenho uma paixão descarada por um instrumento que eles trazem ao pescoço, que emite sons de aves, quando soprado. Já propús várias vezes, cada vez que encontro uma dupla ou trio desses a tocar em praças ou ruas, se não me vendem e me ensinam a tocar. Nada. É deles, prá seu uso e só se compra lá no país deles. Nem sequer sei o nome. É uma espécie de apito. Acho que vou ter que ir à fonte.







Um dia bem passado, o de hoje.

Amanhã é dia de ir à praia cedo. O mar fica logo aqui em frente, de onde está estacionada a autocaravana, no Parque de Campismo, tem-se uma vista magnífica, desde que o dia amanhece. É um mar muito azul, que faz toda a justiça à fama da vila.


* tamboril - peixe de água salgada, encontrado em águas profundas.

quinta-feira, abril 14, 2011

Parabéns, Mestre Gabriel!


Temos o coração em festa por ti, filho querido.

Mais uma conquista.

E mais bonito ainda é ver a tua felicidade, ao lado desta parceira maravilhosa que é a Rê.

Mês que vem é a tua vez, Renatinha! Êta gurizada bacana!

quarta-feira, abril 13, 2011

Talvez

Brote do incomum o desenho mais puro e verdadeiro.

Entrega

Quando a alma está inteira, ocupando todos os espaços possíveis, com toda a intensidade de que é capaz. Impregnada de vida. Valor em si.

Busca

Do sentido pleno em cada descoberta.

Verdade

Sempre, sempre é tempo de aprender. Descobrir é uma das coisas mais lindas da vida.

Projetos

Em franco andamento. Desafios à vista. Coisas que nos fazem sentir que a vida pulsa. Quando absurdamente acreditávamos já ter visto quase tudo.

Fase

Música. Leitura. Cinema. Estudo. Introspecção. Sentimento à flor da pele. Olhar profundamente nos olhos das pessoas. O mais próximo possível da verdade e do que realmente tem valor. Fuga? Não. Instinto de preservação. Aguçado.

Atitude

Necessária, quando o que está em jogo é resgatar-se. Tenho pensado muito nisso.

Da saudade e dos sonhos

Um dia, assim do nada, começamos a ter saudade de nós mesmos. E às vezes é uma saudade tão grande e tão profunda, que precisamos parar, ver o que andamos fazendo, fazer-nos umas tantas perguntas, tentar algumas respostas e retomar o caminho, ou rever tudo. E começar do zero, se for este o caso. Força de expressão, claro, que do zero ninguém começa, depois de ter vivido e vivido e nunca estar cansado de viver. Leva-se os registros vida afora. E há sempre algum sonho escondido, à espreita, à espera. Uma qualquer coisa que não se fez. Uma ânsia, uma vontade, algum desejo que guardamos prá um dia qualquer, depois de termos feito tudo o que era supostamente preciso, mas que um belo dia aflora e vem tal uma raíz que, ao procurar a luz, dá por si a rebentar as pedras da calçada. Neste momento, e já de uns tempos prá cá, ando a rever sonhos. Ando a minhocar. Voltada prá dentro, a espreitar o interior, como quem revisita a casa onde viveu na infância, a buscar os cantos preferidos, a caixinha dos botões que viravam gentes, móveis, carros. Lugares de sonhar histórias, como se fôssemos deuses a movimentar os cordéis de todos os mundos que inventávamos. Uma vez pensava que o mundo era isso: um brinquedo de Deus. E nós os bonecos, as cidadezinhas minúsculas, sujeitos às suas vontades. Depois cresci. E era suposto entender tudo de outra forma, mas devo ter vindo até aqui por algum caminho torto. De um jeito curiosamente normal, a fantasia continua lá. E os sonhos se multiplicando em raízes de puro viço, a rebentar as ruas do meu caminho. Que pode até ser torto, não sei. Mas que tem a audácia de querer ser real. Ando resgatando sonhos, é verdade. Colada neles, a parte de mim que andava perdida em algum canto deixado prá trás. Tinha tanta saudade...

segunda-feira, abril 11, 2011

NO DIRECTION HOME - BOB DYLAN


Uma preciosidade do Martin Scorsese. A trajetória de um dos músicos mais influentes, inspiradores e inovadores do nosso tempo. Uma viagem de Bob Dylan das suas raízes no Minnesota, passando pelos cafés de Greenwich Village, até a sua tumultuada ascensão ao estrelato do pop, em 1966. Do folk ao rock, quase tudo contado por ele mesmo, por Joan Baez, por Allen Ginsberg e muitos outros músicos, produtores e parceiros. Uma obra emocionante. Não dá prá sentir os 113 minutos de duração, fica a querer-se mais.

O que me encanta nele: as composições, a voz única, a gaitinha de boca, a personalidade e, sobretudo, o fato de ter sido fiel a tudo aquilo que quis fazer, de forma determinada e uma perseverança apaixonante.

No filme, a serenidade e a paixão dele a contar a vida, a compilação de imagens e a naturalidade com que tudo transcorre.

Acabei de assistir.

Fiquei ainda mais fã.

Recomendo, de coração.

segunda-feira, abril 04, 2011

MARIA GADÚ - Lição de simplicidade, show de talento e uma voz que entra no ouvido e fica na alma.


Ando a ouvir, a ouvir, a ouvir.

Que menina!

IMPRESSIONANTE - RITA LEE AOS 63 ANOS!


Andei fazendo uma incursão à FNAC no fim de semana. Achei esta pérola em DVD. Rita Lee - Multishow ao Vivo, gravado em 2009. Eu fico encantada com esta mulher. É tudo de bom!


"No ar que eu respiro eu sinto prazer de ser quem eu sou" (Rita Lee)

domingo, abril 03, 2011

CHURRASCO - Porco no rolete





Hoje foi dia de relembrar os nossos costumes, lá do sul do sul do meu Brasil. Se bem que não tenho lembrança de porco no rolete lá pros nossos lados, mas vá lá. O Seu Camargo, o nosso gaúcho de plantão aqui no país, nos fez o desaforo de convidar para aquele churrasco especial, que só ele e a família sabem fazer. Levei os cds do Júlio Saldanha, do Miguel Marques e do Francisco Espenosse, que trouxe de Santiago noutro dia. Um sucesso. O povo que estava por lá adorou. Queria ligar ao pessoal e contar que estavam sendo ouvidos por aqui. Mas não sabia o telefone de nenhum deles. Um fiasco! E como o mundo, apesar de não ser redondo (como já se sabe) e ser geóide, continua sendo pequeno nessas circunstâncias, apareceu por lá um tio do Júlio Saldanha, de sobrenome Camargo, com um cd igualzinho, do sobrinho. Claro que nos achamos. E atualizamos todos os assuntos santiaguenses, prá faceirice dele, que está longe já há algum tempo. Mora em Portugal, veio prá perto dos filhos, que vivem cá. Belo domingo passado na companhia de brasucas e portugas, com muita música, dança e boa comida.

UM VIOLINO NO TELHADO


É como aqui foi chamado o musical a que fomos assistir ontem à noite, no Teatro Politeama, sob a batuta do espetacular Filipe La Féria. Eu digo, repito e torno a dizer: desde que estou em Lisboa, todos os musicais produzidos pelo La Féria a que tive o prazer de assistir foram impecáveis, surpreendentes e inesquecíveis. Não sei o que há com o homem, mas tudo o que ele toca vira ouro. Pedra lapidada. E brilha! Puro talento, sentimento, emoção e o que mais seja. E o detalhe? Ontem, quando eu já não esperava mais surpresas, passa um comboio daqueles antigos, levando uma das protagonistas a caminho da Sibéria, para reecontrar o amor da sua vida. Mas um comboio funcionando, com luxo de detalhes, perfeito e verdadeiro, como parece ser tudo dentro daquele musical e de todos os outros a que assisti. Estou pasma, encantada, emocionada e feliz pela oportunidade única de ver o trabalho deste homem e de todos os atores, músicos, cantores que fazem parte dos elencos, igualmente impecáveis. Vida longa a Filipe La Féria, ao Politeama e aos espetáculos mais lindos que já assisti na vida.

sábado, abril 02, 2011

HÁ DIAS ASSIM...


E, claro, a minha mãe Hélène num dia qualquer previu isso. Como não poderia deixar de ser. Cá estou, desde que acordei, enfiada de ponta cabeça em tudo quanto tiver a ver com música, poesia e criação. Nestes dias, dizia ela, nada mais vai existir...como um mergulho prá dentro de ti. Ela sabia. E sabe. Sempre vai saber. Em pequena, quando eu sumia, andava enfiada por algum canto, olhos grudados nas página de algum livro, hipnotizada e alheia. Nem comer...nem banho, nem brincar, nem nada. Não havia horas, nem lugares, o tempo era meu. Depois vieram os escritos. Horas a fio embrenhada no emaranhado das letras, a escrever as palavras que não ousavam sair pela boca. Ela guardava tudo isso em uma caixa, como quem guarda um tesouro. Mas um dia, em uma das tantas mudanças, a caixa se perdeu junto com uma pluma enorme e muito branca, que adornava o chapéu usado algumas vezes, quando era baliza da banda marcial do colégio Dom João Braga, em Pelotas. Não importa, mãe,ficou tudo gravado em mim. Foi ela quem vislumbrou que nesses dias eu não faria nada mais. E que dificilmente alguém conseguiria penetrar neste mundo, a não ser que voasse os mesmos vôos, de asas iguais. Há dias assim, é verdade, mãe. E só nós sabemos o quanto eles são parte de mim e eu sou parte deste mundo de fantasias infinitas. A voar...sem rumo e sem tempo, à procura do inusitado. Se sou assim, é porque um dia - e só podia vir deste laço - a senhora conseguiu ver e entender. Obrigada, mãe, por ter me ensinado a ser livre e mostrado o quanto a liberdade é sagrada.